quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

Os Sentidos

Não era difícil definir os males que levariam os homens à decadência. As hipóteses eram muito óbvias. Qualquer um que vivia naqueles dias poderia fazê-las.
Não só a falta de recursos como a água, a comida, mas também a falta do amor, do pudor, do respeito...
E lá se vai.
Mas erguia-se naquele tempo outro mal subentendido, a respeito do qual ninguém fazia ideia.
Era este a ausência de sentido.
Padeciam pela falta de sentido.

Eles saiam de casa toda manhã, para ir a lugares indesejados, fazer aquilo que não gostavam e durante horas.
Mas nesses momentos a necessidade se fazia justificativa.
Era preciso trabalhar para comer, pagar contas e se possível divertir-se.
Mas só suprimir o básico não é suficiente.
Não é o homem o animal que tempera sua comida para comê-la?
E não apenas a come. Saboreia-a.
Não basta pão e água, é preciso mais.
Então iam à busca do lazer.
Em suas casas ligavam a TV por horas seguidas, a qual falava abobrinhas às paredes e a qualquer outro que quisesse se unir ao sofá, que era todo ouvidos também.
Ansiavam pela noite, salvadora do dia, e de toda semana chata.
Saíam. E por mais diferentes que parecessem, eram os mesmos lugares, mas sempre com pessoas diferentes, que pareciam sempre as mesmas pessoas. Um sábado e só.
E o lazer perdia sentido.

E então procuravam o amor,
mas escasso naquele tempo, as pessoas já não se olhavam nos olhos, passavam apressadamente entre si, ainda que se vissem com freqüência.
Ah os jovens! Buscavam-no nas aglomerações. Frustrados bebiam e dançavam e beijavam-se.
O que já não fazia sentido também. Era vazio.
Mas lembrem-se de que o homem faz o uso do sal.
Logo, ainda que demorasse, acabavam por encontrar outro alguém.
Então se casavam.
E o tempo repetia-se, e tudo virava rotina.
Comer, trabalhar, lazer, amor...

E os sentidos perdiam-se
E aí vinha a vontade de mudar, de reformulá-los
Mas esta fora suprimida pelo tempo, julgamentos e condicionamentos.
E os homens viam-se velhos
E conformavam-se
E morriam conformados.
E morriam como as gerações passadas.    


Tamiris Vescovi Casotto




sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

Droga lícita

O teatro é uma droga lícita, bem como o cigarro e a cerveja.
Pode-se fumar, é legalizado, reconhecido.
Pode-se beber.
O teatro é o reconhecimento da loucura. É a justificativa da loucura.
Loucura, droga lícita.
Pode ser louco, está justificado. Fumar e beber também.
Oficializa-se algo
Este torna-se aceitável
Pode-se ser louco
Pode-se fazer teatro